Mas como foi isto possível?

Estou a mais de 1.000 Kms de distância e, ainda assim, ao ver as imagens do fogo a devastar a ilha da Madeira, sinto as picadelas do fumo nos olhos. Gosto daquela terra como de poucas. Tenho-lhe um amor genuíno. Um amor que sei feito de mar, filhos e gratidão.

Bato as pálpebras uma e outra vez e o olhar mantém-se confuso. Vejo o desnorte daquela gente sem sorte, a quem faltou proteção e verdade, e a quem agora falta tudo. Bato-as mais uma vez e vejo o fogo a engolir as serras, as casas, os velhos e a vaidade de quem achou que era capaz de o deter sozinho. Vejo que o fogo atingiu o centro histórico, a freguesia de S. Pedro. Recordo o dia em que falámos em batizar os miúdos naquela igreja. O dia em que trouxemos, de um antiquário ali ao pé, as cadeiras da nossa sala de jantar. O dia em que me encantei com o convento de Santa Clara. São pedaços da minha memória, feitos do que sou, que agora se esfumam à velocidade da progressão daquele fogo que não pára. Afligem-me as picadelas nos olhos. É do fumo. Mas é ainda mais da tristeza.

Mas como foi isto possível?

Já vos tinha dito que estamos quase, quase, de férias, e que na mala vai de férias o blog também. Não vos disse porém que as férias serão no Funchal e que na mala levamos também aflição, mas sobretudo enorme solidariedade.

Agora sim, vemo-nos em setembro.


Foto de Gregório Cunha / Lusa.

Comentários

  1. É só para dizer que a autoria da foto que ilustra esta crónica é de Gregório Cunha/Lusa.

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